Vitalidade na maturidade
Um salão de baile que reúne veteranos com ruguinhas no rosto, mas cheios de vida, como Alice (Tônia Carrero), Álvaro (Leonardo Villar), Eudes (Stephan Nercessian), Marici (Cássia Kiss), Elza (Betty Faria) e ainda os calouros Bel (Maria Flor) e Marquinhos (Paulo Vilhena). Este é o cenário em que se passa “Chega de Saudade”, de Laís Bondanzki.
Ao contrário do que acontece em filmes como “Vem dançar comigo” , o objetivo da cineasta não é fazer uma história sobre dança e, sim, sobre a vitalidade na maturidade. Prova disso são os enquadramentos escolhidos por Walter Carvalho, que privilegia muito mais closes do que planos abertos, geralmente utilizados para mostrar coreografias. Em "Chega de Saudade", a lente de cores vivas do fotógrafo circula pelo salão em busca de detalhes, entre eles sapatos de dança, pés como instrumentos de sedução ou acompanhando a melodia tocada, e, até mesmo, marcas de expressão.
A opção da cineasta por focar a narrativa nos bailes de Terceira Idade pode despertar um gostinho de “falta alguma coisa” ou até mesmo estranhamento na nova geração de pés-de-valsa, interessada em coreografias com passos de efeito e acostumada a frequentar ambientes com estilo mais “fashion” e seguranças na porta, onde não são encontrados com tanta freqüência personagens, como o cavalheiro de aluguel.
No entanto, até mesmo os mais jovens se identificam com os personagens em situações com as quais nos deparamos nos bailes de dança e da vida, principalmente as mulheres. A alegria de ser cortejada e virar centro de disputa tácita ou escancarada de dois corações apaixonados. O friozinho na barriga ao vislumbrar a possibilidade de um relacionamento depois de tempos de solidão. A decisão de chegar junto do cavalheiro almejado e confessar um amor evidente, mas secreto. A revolta por ser traída. O contentamento por dar troco à rejeição. A excitação motivada por olhares certeiros, toque calorosos e pela conquista. A tentativa de se insinuar para chamar a atenção do sexo oposto. A frustração de ficar de molho na cadeira por falta de convites. A tristeza de se arrumar para ser vista e nem ser notada. O gosto amargo de ver a pessoa amada encantada por alguém mais atraente.
Sendo assim, a história de Bondanzki tem o mérito de explorar a figura feminina em um meio que, volta e meia, direciona os holofotes para os cavalheiros, seja por serem os responsáveis pela condução da dama, os concretizadores da conquista ou mesmo o grupo em menor quantidade no salão, que pode se dar ao luxo de escolher quem dançará e quem tomará “chá de cadeira”. Justamente por tratar com precisão estes dramas femininos, o filme deve ser referência obrigatória para os “fominhas de salão” que pensam que colocar-se no lugar da parceira é saber apenas executar os passos delas, sem atentar para os sentimentos reunidos no imaginário da dama. Um universo particular acessado a cada abraço que inaugura uma dança.
Todos estes fatores por si só já seriam razões para ver “Chega de Saudade”, mas não o principal mérito do longa-metragem. Seu diferencial é apresentar a Terceira Idade de forma menos sisuda e mais verossímil. Uma geração que soma anos de vida e não vê a chegada dos cabelos brancos necessariamente como a proximidade de um fim eminente. Pessoas que se permitem viver amores e, mesmo na maturidade, ainda sentem o coração acelerado e ficam ansiosas a cada troca de olhares, como pré-adolescentes. Pessoas que se permitem ter relacionamentos abertos e romances tórridos de uma noite só, como os jovens de hoje. Pessoas que relembram e redescobrem a juventude no salão e, por isso, passam a freqüentá-lo religiosamente.
A temática é mais do quem bem-vinda levando-se em conta o aumento de praticamente 32,4% da expectativa de vida do País, desde 1960 a 2006, segundo dados do IBGE. O fato anuncia a necessidade de tornar mais freqüente e aberto o debate de assuntos relacionados a esta faixa etária, entre eles formas de viver a sexualidade com prazer e segurança na maturidade – discussão mais do que propícia, tendo em vista o crescimento do número de idosos com Doenças Sexualmente Transmissíveis.
Não é à toa que as salas que exibem o filme estão repletas de idosos, ansiosos por verem uma trama na qual têm destaque e não aparecem estereotipados como “os fofos” ou “os abandonados pela família”. Com um elenco de primeira, o filme apresenta personagens reais, nem sempre impecáceis moralmente. Dá voz ao conquistador que corteja uma garota mais jovem e comprometida, enquanto garante companhia para a noite com uma amiga de baile; ao homem que finge não ser casado para se aventurar com outras damas; à mulher que trai e à que faz jogo duro, sem esquecer de pontuar sutilmente problemas como o Alzheimer ou o medo da morte.
Que “Chega de Saudade” seja um ponto de partida para a valorização do rico universo da maturidade, tanto nas telas, nos bailes, como no dia-a-dia.
Ao contrário do que acontece em filmes como “Vem dançar comigo” , o objetivo da cineasta não é fazer uma história sobre dança e, sim, sobre a vitalidade na maturidade. Prova disso são os enquadramentos escolhidos por Walter Carvalho, que privilegia muito mais closes do que planos abertos, geralmente utilizados para mostrar coreografias. Em "Chega de Saudade", a lente de cores vivas do fotógrafo circula pelo salão em busca de detalhes, entre eles sapatos de dança, pés como instrumentos de sedução ou acompanhando a melodia tocada, e, até mesmo, marcas de expressão.
A opção da cineasta por focar a narrativa nos bailes de Terceira Idade pode despertar um gostinho de “falta alguma coisa” ou até mesmo estranhamento na nova geração de pés-de-valsa, interessada em coreografias com passos de efeito e acostumada a frequentar ambientes com estilo mais “fashion” e seguranças na porta, onde não são encontrados com tanta freqüência personagens, como o cavalheiro de aluguel.
No entanto, até mesmo os mais jovens se identificam com os personagens em situações com as quais nos deparamos nos bailes de dança e da vida, principalmente as mulheres. A alegria de ser cortejada e virar centro de disputa tácita ou escancarada de dois corações apaixonados. O friozinho na barriga ao vislumbrar a possibilidade de um relacionamento depois de tempos de solidão. A decisão de chegar junto do cavalheiro almejado e confessar um amor evidente, mas secreto. A revolta por ser traída. O contentamento por dar troco à rejeição. A excitação motivada por olhares certeiros, toque calorosos e pela conquista. A tentativa de se insinuar para chamar a atenção do sexo oposto. A frustração de ficar de molho na cadeira por falta de convites. A tristeza de se arrumar para ser vista e nem ser notada. O gosto amargo de ver a pessoa amada encantada por alguém mais atraente.
Sendo assim, a história de Bondanzki tem o mérito de explorar a figura feminina em um meio que, volta e meia, direciona os holofotes para os cavalheiros, seja por serem os responsáveis pela condução da dama, os concretizadores da conquista ou mesmo o grupo em menor quantidade no salão, que pode se dar ao luxo de escolher quem dançará e quem tomará “chá de cadeira”. Justamente por tratar com precisão estes dramas femininos, o filme deve ser referência obrigatória para os “fominhas de salão” que pensam que colocar-se no lugar da parceira é saber apenas executar os passos delas, sem atentar para os sentimentos reunidos no imaginário da dama. Um universo particular acessado a cada abraço que inaugura uma dança.
Todos estes fatores por si só já seriam razões para ver “Chega de Saudade”, mas não o principal mérito do longa-metragem. Seu diferencial é apresentar a Terceira Idade de forma menos sisuda e mais verossímil. Uma geração que soma anos de vida e não vê a chegada dos cabelos brancos necessariamente como a proximidade de um fim eminente. Pessoas que se permitem viver amores e, mesmo na maturidade, ainda sentem o coração acelerado e ficam ansiosas a cada troca de olhares, como pré-adolescentes. Pessoas que se permitem ter relacionamentos abertos e romances tórridos de uma noite só, como os jovens de hoje. Pessoas que relembram e redescobrem a juventude no salão e, por isso, passam a freqüentá-lo religiosamente.
A temática é mais do quem bem-vinda levando-se em conta o aumento de praticamente 32,4% da expectativa de vida do País, desde 1960 a 2006, segundo dados do IBGE. O fato anuncia a necessidade de tornar mais freqüente e aberto o debate de assuntos relacionados a esta faixa etária, entre eles formas de viver a sexualidade com prazer e segurança na maturidade – discussão mais do que propícia, tendo em vista o crescimento do número de idosos com Doenças Sexualmente Transmissíveis.
Não é à toa que as salas que exibem o filme estão repletas de idosos, ansiosos por verem uma trama na qual têm destaque e não aparecem estereotipados como “os fofos” ou “os abandonados pela família”. Com um elenco de primeira, o filme apresenta personagens reais, nem sempre impecáceis moralmente. Dá voz ao conquistador que corteja uma garota mais jovem e comprometida, enquanto garante companhia para a noite com uma amiga de baile; ao homem que finge não ser casado para se aventurar com outras damas; à mulher que trai e à que faz jogo duro, sem esquecer de pontuar sutilmente problemas como o Alzheimer ou o medo da morte.
Que “Chega de Saudade” seja um ponto de partida para a valorização do rico universo da maturidade, tanto nas telas, nos bailes, como no dia-a-dia.